Uma carta de 28/06/2025
Meu querido eu do futuro
Hoje é sábado a noite, 28/06/2025. Normalmente não gosto de ficar em casa sábado a noite. Acredito que sábados a noite foram feitos para colocar uma roupa bonita, se arrumar com mais calma e cuidado do que nos outros dias e sair, ver gente, conhecer lugares, comer, beber, ouvir, rir. Sábados a noite são sensoriais, mas hoje não quis sair. Parece que a vida está deixando tudo muito insatisfatório, como um convite para mudança, um chamado para a coragem de se mexer. E eu estou paralisada, me sinto presa as escolhas que fiz. Eu tenho esse emprego, numa escola referência, aos 25 anos já ocupava o cargo de professora de nível superior, e é o que sonhei por muitos anos. Tenho um bom salário, uma sala só para mim, uma mesa em L grande da qual sou apaixonada, janelas com vista para árvores lindas, na minha sala tem ar-condicionado e aquecedor. Meus alunos, em sua maioria, são divertidos, inteligentes, conversadores e as aulas quase sempre são leves, com risadas. Tenho bons colegas de trabalho, pessoas que me adoram, que vivem reafirmando o quanto me admiram. E por alguma razão, ou por várias razões, tem sido extremamente dificil para mim continuar trabalhando nesse lugar. Eu não gosto das disciplinas que leciono, não gosto do trânsito infernal que pego todos os dias e todos os 6 ônibus diários e tem sugado todas as minhas energias, eu continuo porque preciso do salário e porque tenho a vontade de honrar com meu compromisso, afinal se saísse agora, meus alunos ficariam desamparados e sem professor por um tempo e agora falta tão pouco. Faz exatos 11 meses que conclui o mestrado e certa de que logo faria o doutorado e agora já não tenho mais tanta certeza. Certeza apenas do que não quero. IFC e Araquari. Estou numa fase de muita reflexão, repensando muito minha carreira e no que quero para minha vida e aquela convicção e amor que tinha pela docência, agora parece já não fazer sentido pra mim. Desde que terminei o mestrado, deixei para trás meu apartamento alugado em araquari e minha roommate, maria eduarda, para vir morar com a minha vó. No começo era para ser temporário e agora já não tenho previsão de me mudar daqui. Minha vó é muito carinhosa e prestativa, cozinha muito bem, conversa muito e me sinto feliz em morar com ela. Ela é generosa. Mas nos últimos tempos ela tem tido muitos problemas de saúde, ficou mais surda, está tomando remédio para alzheimer, problema no quadril, tem recomendação para cirurgia, já tem duas próteses nos joelhos, tem diabetes tipo II, hipertensão e mais muitos problemas. Devido isso eu tenho acompanhado muito ela a consultas, exames, fisioterapia, também sou eu que a levo para fazer compras, ir ao banco, enfim, tudo que ela precisa. Tem exigido muito de mim e me deixa triste porque meu pai e minha tia, que deveriam ser os responsáveis por ela, são muito displicentes e dissimulados. Mas eu tenho certeza que nunca vou me arrepender de ter vindo morar aqui e de ter esse tempo e esse cuidado com ela. Eu tenho um namorado que tem todas as qualidades e é do jeitinho que pedi a Deus, ele é gentil, carinhoso, muito inteligente, me proporciona conversas muito interessantes, é engraçado, ama e respeita muito a familia. É lindo ver como todos a sua volta, seus pais, sua irmã, sua vó, seus tios e tias o amam e o admiram e toda essa relação e rede que eles tem. Ele sempre me incentiva e me apoia nos meus projetos, sempre escuta minha lamentações, as vezes traz respostas otimistas demais e soluções lógicas demais, mas ainda sim, sempre me escuta. O único problema é que a gente mora muito longe, ele nunca para em lugar nenhum e é extremamente dificil planejar qualquer coisa com ele, sempre preciso estar a mercê das circunstâncias dele e me pego pensando se ele me ama como alguém que ama alguém a ponto de querer por perto sempre. Fico pensando se um dia ele se apaixonasse de uma forma mais visceral por alguém, ele talvez quisesse arrumar a vida dele pra estar com essa pessoa. Eu acho que ele me ama, mas acho que não sou essa pessoa. Eu fico paralisada de fazer algo a respeito porque amo ele demais e sou apegada demais a ele para deixa-lo. Minha irmã teve um bebê, Benjamin, mas vou demorar um tempo ainda para conhecê-lo pessoalmente. Tenho poucas amigas, mas as poucas que tenho são boas, consistentes e leais. Tenho tido muita dificuldade para praticar atividades físicas ou tentar cuidar mais da minha saúde e de mim.